"A democracia é a pior forma de governo, com exceção de todas as demais”. Essa famosa frase, adaptada e atribuída a Winston Churchill[1], primeiro ministro do Reino Unido durante a Segunda Guerra Mundial, diz muito sobre nossa relação com o sistema político que adotamos, no Brasil e na maior parte do mundo, para manter a casa em ordem em nossas cidades, estados, países...
Muita coisa mudou desde que Churchill proferiu tais palavras em 1947: diversos países, entre os quais o Brasil, experimentaram o gosto amargo de autoritarismos de todos os tipos e reestabelecerem, depois de anos de sofridas ditaduras, a ordem democrática. Mas sua observação permanece reveladoramente atual porque, hoje, como outrora, temos que lidar com as inúmeras imperfeições do nosso sistema. Apesar disso, não há como não reconhecer seu maior valor: permitir que TODOS participem – no mínimo através do voto – da definição dos rumos do país.
Há insatisfação com esse ou aquele governo? É possível substituí-lo em eleições periódicas. Há corrupção? É possível enrijecer as leis, como aconteceu com a Ficha Limpa, após grande mobilização popular. Há crise de representatividade? É possível empenhar os mesmos esforços para debater, propor e realizar a tão necessária reforma política (há hoje pelo menos dois grandes movimentos trabalhando nesse sentido). Há uma causa a ser defendida? É possível organizar um movimento social, como o Todos pela Educação, e exigir avanços juntos aos governantes e parlamentares. Há um problema que o Estado não dá conta de resolver sozinho? É possível fundar organizações da sociedade civil, como a Fazenda da Esperança que, há 30 anos, desenvolve um brilhante trabalho de recuperação de dependentes químicos.
O exercício da cidadania vai muito além de apertar o botão verde no domingo e voltar a cuidar da própria vida na segunda-feira, com a convicção de que tudo vai bem ou mal porque meu candidato foi ou não eleito. A responsabilidade pelos rumos do país será tanto minha quanto do/a presidente eleito/a, dos eleitores que votaram nele e dos membros que escolhemos para ocupar o congresso nacional.
É verdade que hoje o tempo de todos anda tão escasso que fica difícil empenhá-lo em qualquer tipo de atividade política e cidadã que vá além do voto. Mas enquanto nos deixamos envolver pela roda da vida, aqueles que deveriam nos representar são influenciados por interesses poderosos, que nos conduzem por caminhos que dificilmente escolheríamos conscientemente. A partir das 20h deste domingo, quando viermos a saber do resultado das Eleições Presidenciais 2014, teremos duas opções diante de nós: esperar mais quatro anos para avaliar o país que passivamente “receberemos” do/a candidato/a eleito/a; ou trabalhar com ele/ela e toda a sociedade para construí-lo, segundo nossas possibilidades.
O (baixo) nível dos debates entre candidatos na TV e entre eleitores nas redes sociais, ao longo desse período eleitoral dá a dimensão do desafio que temos diante de nós. A agressividade que testemunhamos (ou praticamos?) é mais uma daquelas imperfeições que dão razão à frase de Churchill. E não adianta culpar o sistema, porque essa responsabilidade é nossa. Só conseguiremos explorar todo o potencial da nossa democracia na medida em que soubermos conviver com a diversidade e valorizá-la. Ouvir com respeito e abertura aquilo que o outro tem a dizer, ao invés de proclamar agressiva e unilateralmente nossas verdades, é o mínimo que se pode esperar de uma cultura democrática e participativa.
[1] A frase completa faz parte de um discurso de Churchill na Câmara dos Comuns em 11 de novembro de 1947: "Muitas formas de governo foram tentadas e serão tentadas neste mundo de pecado e aflição. Ninguém finge que a democracia é perfeita ou onisciente. De fato, já foi dito que a democracia é a pior forma de governo com exceção de todas as outras formas que foram tentadas de tempos em tempos".