A mídia e o futuro do esporte

No último domingo, o Brasil conquistou pela décima vez o Grand Prix de voleibol feminino, competição criada em 1993 que reúne 28 seleções de todos os continentes. A hegemonia brasileira em 21 anos do torneio coloca a nossa seleção, junto à Cuba, Rússia, China e os Estados Unidos, como uma das principais protagonistas do vôlei mundial.

Essa importante conquista do esporte brasileiro, se analisada de maneira ponderada, pode ajudar muito na reflexão sobre o futuro dos nossos atletas, a pouco menos de dois anos da olimpíada no Brasil. A vitória do vôlei feminino, bem menos midiatizada que os sucessos e fracassos da seleção masculina de futebol, mostra que, para a indústria esportiva, alguns esportes são mais relevantes que outros.

A seleção brasileira feminina de vôlei foi campeã do Grand Prix pela décima vez, no dia 24/08/14, vencendo o Japão por 3 sets a 0. As atuais campeãs olímpicas disputaram 14 partidas e perderam apenas uma para alcançarem o inédito décimo triunfo. Foto: FIVB (24/08/2014)

A mídia e o esporte

Esgrima, judô, natação, salto em distância são alguns exemplos de modalidade que dificilmente você, leitor, acompanha com frequência. Um aspecto que justifica esse fenômeno é que, geralmente, esses esportes raramente conseguem algum destaque nos meios de comunicação.

Dessa forma, com certo cuidado, é possível afirmar que a mídia condiciona nossos gostos esportivos. Seguimos as modalidades e os atletas que aparecem na televisão, nos grandes portais da internet, no jornal impresso, enquanto os desconhecidos, mesmo conquistando bons resultados em competições pelo mundo, acabam ignorados pela grande maioria.

A indústria por trás do esporte

As modalidades esportivas e os atletas que conseguem destaque televisivo têm geralmente o apoio econômico de grandes empresas, sobretudo de material esportivo. O filósofo norte-americano Douglas Kellner, em sua obra “A cultura da mídia e o triunfo do espetáculo” acena para a forma com que essas empresas colocam seus logotipos em eventos esportivos importantes, programas de TV, para conseguir atingir os olhares do comprador em potencial.

Não é tão difícil relacionar o fenômeno acima com o futebol masculino. Grandes corporações do mundo, não somente aquelas diretamente relacionadas ao universo esportivo, usam jogadores, técnicos e clubes de futebol para promover suas marcas e a televisão acaba sendo um instrumento decisivo neste processo.

Quais as consequências?

Enfim. A parceria articulada entre empresas privadas e meios de comunicação faz com que acabemos gostando muito mais da Copa do Mundo FIFA que do Grand Prix de vôlei feminino. E não são as diferenças relacionadas à modalidade – pois o vôlei é também um esporte muito competitivo e emocionante -, mas a “espetacularização” por trás do esporte que acaba condicionando nossos gostos. Conhecemos o Neymar, o Fred, o David Luiz, mas a levantadora Dani Lins, a oposta Sheila e a central Fabiana, ambas figurantes do “time dos sonhos” do vôlei feminino mundial, seguem quase desconhecidas.

Essa realidade não engloba somente os atletas do voleibol, cuja modalidade talvez já tenha conquistado uma visibilidade importante. A invisibilidade midiática faz com que muitas outras modalidades, mesmo com atletas talentosos, não consigam patrocínio. E, sem patrocínio, as conquistas esportivas resultam muito mais do heroísmo individual, do que são frutos do planejamento e do investimento social. A falta de visibilidade também leva muitos atletas, principalmente jovens, a encerrarem precocemente suas carreiras, sem jamais poder exprimir plenamente suas capacidades e talentos.

Contudo, o Governo Federal pode ser um contraponto decisivo desta realidade. Por meio de programas de incentivo, muitos jovens talentos podem conquistar o apoio necessário para se desenvolverem, sem a necessidade de uma visibilidade midiática. Mas é preciso que nós exijamos e que os governantes queiram.



Sobre

Fazer do esporte um instrumento de promoção da fraternidade é aceitar o desafio de descobrir, acima de tudo, a prática de atividades físicas como possibilidade de encontro, de relação. Em uma competição esportiva, o adversário não é um inimigo, nem o jogo uma batalha. Por isso, respeitar as regras predefinidas e preservar um espírito de lealdade e honestidade tornam-se elementos essenciais para que o esporte realize a sua missão socioeducativa. Neste blog, queremos identificar, discutir e descobrir os grandes promotores do esporte no Brasil e no mundo e, com eles, refletir sobre valores que ajudam a edificar a nossa sociedade.

Autores

Valter Hugo Muniz

Jornalista com experiências internacionais na Ásia (Indonésia) e na África (Costa do Marfim). Atualmente mora em Genebra, na Suíça. É formado em jornalismo pela PUC-SP. Trabalhou em agências de comunicação, empresas multinacionais, editoras e na televisão. Concluiu recentemente uma pós-graduação no Instituto Universitário Sophia, em Florença, Itália.