O que dizer das eleições

Menos de uma semana após o primeiro turno das eleições presidenciais, arrisco-me a apresentar algumas conclusões preliminares. Assumo o risco de incorreções decorrentes da pouca distância no tempo entre este texto e os eventos que colocaram Dilma, Aécio e outros 28 candidatos estaduais no segundo turno.

1 – As pesquisas

Elas erraram feio. Em tempos de facebook e whatsapp, as chacotas multiplicam-se à exaustão e deixam nossos dias um pouco mais divertidos. Para além disso, os equívocos mostraram mais incompetência do que uma suposta tendência ideológica para cá ou para lá. A realidade é que depois de domingo, será muito difícil sustentar qualquer afirmação conspiratória de que as pesquisas favorecem o PSDB, como ouvi muitas vezes nos últimos meses. No pleito mais importante de todos, os erros foram sempre em “favor” de Marina e Dilma. Em nenhum momento a Aécio foi atribuída a quantidade de votos que ele, no fim, viria a ter. Alguns erros nas disputas estaduais, por outro lado, se...

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O terrorista da semana

Al Qaeda é coisa do passado. A moda agora é o Estado Islâmico. Mas até esse está ficando démodé. Na lista de ameaças iminentes aos Estados Unidos e à Europa, Washington inseriu uma nova organização, que até a semana passada era razoavelmente desconhecida. Trata-se desta vez do grupo Khorasan, que atua na Síria e é capitaneado por Muhsin al Fadhli, homem de confiança de ninguém menos que Osama Bin Laden à época do atentado de 11 de Setembro.

Nas palavras de Obama, Khorosan é uma ameaça ainda mais iminente do que o próprio Estado Islâmico, que até a semana passada condensava em si todo o mal que, acreditava-se, poderia existir na humanidade. Mas os rebeldes liderados por Fadhli estariam mais próximos de promover um atentado terrorista nos Estados Unidos ou na Europa, de acordo com informações da inteligência norte-americana.

Essas informações – de confiabilidade contestável, no mínimo – foram suficientes para legitimar o bombardeio de ontem à Síria, no que pode ter sido o início de um...

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A lacuna de Eduardo

O escopo desse blog é tratar temas de política internacional, mas o momento atual da política brasileira, sobretudo após o trágico acidente que vitimou Eduardo Campos, me impele excepcionalmente a olhar para dentro de nossas fronteiras.

O significado da morte de Campos transcende a perda pessoal da família, que não deve ser subestimada, e também vai além das perspectivas eleitorais para as próximas semanas. No acidente, o país perdeu um líder que começava a despontar como principal voz no cenário nacional de uma esquerda moderada, capaz de dialogar com setores empresariais e da indústria, mas que, ao mesmo tempo, defendia uma política de investimentos sociais importantes.

Obviamente a de Campos era uma estrada tortuosa. Sua opção o tornava vitrine para ataques da esquerda e da direita. Mas o candidato começava a demonstrar seu potencial conciliador, fundamental para a carreira que escolheu e que poderia, no futuro, permitir que transitasse entre as diversas forças e interesses...

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O Chile e o aborto 2/2

No artigo anterior, apresentei a primeira parte dos motivos que me levam a questionar a presidente chilena Michelle Bachelet em sua pretensão de trabalhar pela legalização do aborto em seu país. Argumentei que o feto é um ser humano e que, além disso, é também uma pessoa humana. Mais precisamente argumentei contra esta distinção, que me soa mais como quimera metafísica.

Reconhecer que o feto é uma pessoa, no entanto, não significa admitir que o aborto deva ser proibido. Rebaterei duas argumentações sérias e relevantes levantadas pelos que admitem a humanidade do feto e, ainda assim, defendem o direito ao aborto. A primeira e mais corriqueira é a da autonomia da mulher sobre seu próprio corpo. Quem sustenta essa posição considera que a criminalização do aborto fere esse direito inalienável da mulher de decidir sobre si mesma. Daí deriva a comodidade intelectual de acusar de machismo quem combate o direito ao aborto.

Não resta dúvida de que a mulher deve ser autônoma sobre si e ter o...

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O Fla Flu de Gaza

Israel e Hamas agem como se não houvesse possibilidade de coexistência entre judeus e palestinos. Se este fosse o caso, somente o aniquilamento de um dos dois traria paz à região e ao povo que sobrevivesse. E, no fundo, eles seguem uma lógica precisa. Na medida em que atrelam sua própria existência à condição de não ceder um milímetro em suas exigências – sejam territoriais, religiosas ou culturais –,  não haverá existência plena de uma das partes antes que a outra deixe de habitar esse planeta. Como é pouco provável que, de fato, isso aconteça um dia, eles simplesmente se limitam a matar e morrer de tempos em tempos, numa espiral sem saída.

O conflito contraria os limites da razão, mas impressiona pela capacidade que tem de arregimentar vozes de analistas políticos, jornalistas e observadores interessados, a maioria defendendo ferrenhamente um lado ou outro. É curioso notar como associam facilmente a causa palestina com a esquerda e os interesses judaicos com correntes de...

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O Chile e o aborto

Michelle Bachelet é uma das figuras mais interessantes do cenário político latino-americano. A presidente chilena conseguiu promover grandes avanços em seu país transitando entre a economia de mercado e o desenvolvimento social com mais desenvoltura do que fez Lula por aqui, por exemplo.

Nesta semana, ela ganhou manchetes na imprensa internacional com a declaração de que o aborto será legalizado ainda neste ano em seu país. Defender publicamente o direito ao aborto é algo pouco popular no Brasil. Sabemos que a maioria dos nossos políticos o fariam se pudessem, mas o medo da rejeição eleitoral os impede. Voltando ao caso chileno, exporei em duas etapas (uma agora e outra na próxima semana) minha oposição às pretensões da presidente. Digo isso logo de cara, pois não quero fazer ninguém perder tempo.

Caro leitor, se você acredita que toda oposição ao aborto é necessariamente um machismo, uma alienação, denota reacionarismo ou defesa dos interesses da elite burguesa, fique à vontade para...

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Sobre

As relações entre governos, organizações e demais atores no espaço físico, virtual e conceitual que extrapola as fronteiras de um Estado lança novos desafios para a atuação da fraternidade na política. A ausência de um agente com legitimidade coercitiva expõe o drama, mas também as possibilidades, da relação fraterna entre sujeitos em condição de paridade, responsabilidade mútua e liberdade para cooperar ou não uns com os outros. Neste blog, abordaremos os desdobramentos desse fenômeno.

Autores

Thiago Borges

Repórter da revista Cidade Nova há quase dois anos, é jornalista formado pela faculdade Cásper Líbero. Foi redator da agência internacional de notícias Ansa por três anos e concluiu recentemente uma pós-graduação em Filosofia Política no Instituto Universitário Sophia, em Florença – Itália.