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Outro mundo só é possível com debate sobre população negra, diz ativista

Para Giselle dos Anjos Santos, do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades, deve-se superar a invisibilidade histórica dessa parcela importante da sociedade

por Camila Maciel – Agência Brasil   publicado às 08:37 de 21/01/2016, modificado às 08:37 de 21/01/2016

O cabelo crespo, o turbante e a estética africana nas roupas são exemplos de como a resistência e a história das mulheres negras se apresentam no cotidiano. Durante o Fórum Social Temático, que ocorre em Porto Alegre, elas trouxeram para uma roda de conversa as diversas experiências que marcaram suas vidas e o processo de construção da própria identidade.

Porto Alegre, 20/01/2016 - Debate com o tema "Mulheres Negras: história, memória e resistência", durante o Fórum Social Temático, em Porto Alegre. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

“Assumi meu cabelo há dois anos. Antes, eu alisava. Engraçado que ninguém disse que ficou bom. As pessoas dizem que ficava melhor antes. Quem me disse o contrário foram vocês [mulheres negras], fomos nós”, relatou Ana Carla Vidal, da Associação Cultural de Mulheres Negras (Acemun).

Ana Carla lembrou também o período em que entrou na faculdade de história no início dos anos 2000. “Eu me orgulhava pela ideia da meritocracia. Só depois fui entender porque só éramos dois negros naquele curso e porque outros não chegavam ali”, relatou.

Ao lado dela, Renata Lopes, representante da Fundação Cultural Palmares, lembrou que entrou assustada e se sentindo estranha na universidade. “Quando vejo a juventude que está entrando hoje, espero que estejam mais empoderadas do que eu estive”, disse ao relembrar dificuldades básicas, como a falta de recursos para o transporte e para o lanche.

Giselle dos Anjos Santos, do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert), organização não governamental que propôs a atividade, aponta que há grande invisibilidade em relação a história das mulheres negras. “Sempre faço uma provocação de perguntar quando as pessoas tiveram contato, na formação escolar, com mulheres negras, de como elas se fizeram presentes na história. Vejo a incógnita na cara das pessoas”, destacou.

Ela lembra que esse segmento representam cerca de 25% da população brasileira. “Se não acessamos essas contribuições, não conhecemos nossa história”, avaliou.

Para ela, não é possível pensar outro modelo de desenvolvimento, como propõe o Fórum Social Mundial, sem o recorte de gênero e raça. “Não dá para pensar na construção e ressignificação de outro mundo sem discutir e problematizar quais são as pessoas que estão em uma condição mais vulnerável na nossa sociedade, que sempre é a população negra, a mulher negra”, defende.

Vanda Vieira, do Movimento Negro Unificado, lembrou formas de resistência como o uso da palavra em espaços públicos e a participação em registros fotográficos em eventos. “Normalmente, não falamos no microfone e sentamos lá nas últimas cadeiras. Costumo falar que não podemos passar da terceira fila [de cadeiras]. Temos tantas formas de resistir que não usamos”, disse.

Giselle reforça que é fundamental perceber pequenos atos de insurgência no cotidiano. “Muitas mulheres relataram a questão de entrar na universidade, a questão estética, que, para nós, assumir o cabelo natural é política, diante de um padrão que é excludente”, citou.

A coordenadora do Geledés – Instituto da Mulher Negra, Nilza Iraci, questiona a falta de mulheres, por exemplo, nos espaços de maior expressão do Fórum Social Temático, que são as mesas de convergência. “Sempre é uma luta muito grande para incluir a questão racial, seja no comitê internacional, seja em qualquer outro espaço”, avaliou.

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