Estreia na próxima quinta-feira, 20 de novembro, o filme brasileiro Boa Sorte, eleito pelo júri popular como o melhor do Festival de Paulínia. Com direção de Carolina Jabor (filha de Arnaldo Jabor), o longa-metragem adapta o conto Frontal com Fanta, do cineasta gaúcho Jorge Furtado, recrutado para escrever o roteiro com seu filho, Pedro.
Cena do filme Boa Sorte. Foto: Divulgação
A história se passa numa clínica de reabilitação, onde João (personagem de João Pedro Zappa) é internado pelos pais, após apresentar vício no ansiolítico que encontrou na bolsa da mãe. Nesta instituição tomada por desajustados, ele se aproxima de Judite (Deborah Secco), uma drogada soropositiva. Daí surge um amor improvável, sem dúvida, o grande chamariz do filme. Drogas lícitas e ilícitas, HIV, adolescência são temas presentes, mas que jamais roubam a construção do romance.
Deborah está impressionante. É o melhor papel de sua vida. Quase sempre refém de personagens de perfil sensualizado nas telenovelas, a atriz que despontou em Confissões de Adolescente encontrou no cinema o rumo para dar uma nova guinada em sua carreira. “Tive que provar isso por fora”, disse num breve papo que teve recentemente com este repórter.
Boa Sorte vale por ela. Mas também vale por tudo aquilo que o filme aborda, em especial ao mostrar o desejo de invisibilidade de uma juventude sem referenciais. “Cada vez as pessoas se enxergam menos”, sentencia Deborah.
Tem se falado muito da transformação física que você passou para encarar este papel (perdeu 11 kg). Mas uma transformação física não é nada se não vem acompanhada de uma transformação emocional...
Todo mundo fala muito da mudança física... Eu até fico triste... Ela, de fato, chama atenção, é o que todo mundo vê de cara, mas quando as pessoas assistirem ao filme vão entender que a transformação é muito maior do que a física. Pela primeira vez eu consegui me despir completamente da Deborah e dar espaço para a personagem vir 100%.
Você se espelhou em pessoas reais para embasar a construção da Judite?
Eu fui atrás do David Uip, que é o secretário de saúde do Estado de São Paulo, para que ele me pudesse explicar um pouco mais sobre essa doença (a Aids), na época em que era quase uma sentença de morte. Quis entender o que ele via em comum nos pacientes quando tinham esse diagnóstico, essa notícia. Queria entender o quanto a pessoa mudava. Ele falou que lutava muito pela vida de cada paciente e que aprendeu muito com eles. Contou que eles tinham uma força baseada na serenidade.
Além de atuar, você assina o filme como co-produtora. Em quais outros aspectos você colaborou?
Eu me envolvo em tudo, né? Eu falo que virei co-produtora para não virar uma atriz chata, sabe? De fato, me envolvo em tudo. Eu não consigo mais só decorar o texto e fazer a cena. Fico dentro daquela energia, sou movida por isso. Não tem jeito.
Você participou na escolha de seu par, o João Pedro Zappa?
Ajudei sim, dei palpites.
Afinal, o filme é praticamente só com vocês dois...
Na verdade, o filme é a história dele. O fato de a Judite ser apaixonante, acaba roubando a atenção do espectador.
Quando conversei com a Carolina Jabor, ela te elogiou dizendo que você é uma atriz que tem o domínio técnico e não deixa de ser intensa e apaixonada. O que faz você manter essa vitalidade, sem entrar no piloto automático?
Isso é uma característica minha como pessoa. Eu realmente não sou uma pessoa acomodada. O fácil não me seduz.
Papéis como o da Judite, com esse tipo de densidade, poderão surgir para você na televisão?
Acho que sim. Acho que tive que fazer isso fora, para que lá eles pudessem ter essa ousadia. Depois que dá certo um personagem, a empresa (a Globo) passa a querer que você faça sempre ele. Acho que realmente fez toda a diferença essa minha escolha. Eu tive que provar isso por fora. Tenho certeza que vou fazer isso lá.
O filme faz o retrato de uma juventude sem rumos, sem escolhas, vagando na invisibilidade... A adolescência sempre foi assim ou há uma crise geracional?
Na verdade eu vejo uma crise generalizada. Cada vez as pessoas se enxergam menos, se falam menos, se entregam menos, se amam menos. É um assunto muito atual. É esse paradoxo da Judite que está morrendo lutando para viver, enquanto o João que está vivo toma remédios e se dopa para morrer. Isso é muito doido, né?
Veja aqui um trecho do filme