Passada a fúria futebolística da Copa do Mundo, o mercado do entretenimento saiu da letargia e voltou a cumprir uma agenda farta de lançamentos e espetáculos. Difícil é conseguir apreciar tamanho volume de novidades. Daquilo que já deixou a pilha de discos novos que se acumula aqui em casa, quero enaltecer três álbuns, no mínimo, interessantíssimos. Não vou cair na empolgação desmedida a ponto de colocá-los entre os “melhores do ano”, mas fatalmente merecem muito mais do que uma única ouvida.
Banda do Mar – Banda do Mar
Pelo que representa Marcelo Camelo, por aquilo que ele fez com os Los Hermanos, é natural observar um hype em torno do grupo (projeto?) que ele constituiu com Mallu Magalhães, sua mulher, e com o amigo de longa data Fred Ferreira. Este power trio de afinidades familiares encontrou em Portugal, terra natal de Fred, uma simpatia por um pop ensolarado, de perfil sessentista e sotaque forjado na surf music. Dos doze temas, sete são de Marcelo e cinco de Mallu. Quase todos refletem um estado de espírito leve, radiante. Entre os destaques, estão Hey Nana, Muitos Chocolates e Faz Tempo. É, sim, possível identificar o DNA dos trabalhos solo de Camelo e algo que veio da época dos Hermanos. São laços de uma composição que privilegia um olhar sentimental perante ao mundo. A diferença elementar é que a Banda do Mar consegue soar despretensiosa, como se apenas celebrar fosse a melhor desculpa para se fazer música. E não é?
O Terno – O Terno
Este trio formado em São Paulo é, talvez, o que há de mais interessante no cenário do rock brasileiro. Quando surgiram, Tim Bernardes (voz e guitarras), Guilherme d’Almeida (baixo) e Victor Chaves (bateria) não esconderam a veneração pelos anos 60, em especial de Kinks e os Beatles. Agora, com o segundo disco, eles dão passo menos estético e mais autoral. O som emula, sim, diversos passados, mas não é por aí que O Terno prova seu amadurecimento. A chave está numa composição que lembra o exercício da crônica. Nada de grandes temas. A força está na narrativa, nos detalhes captados no cotidiano. Coisas do tipo: “Nasce mais uma manhã nublada em SP/ O jornal arremessado/ O copo de café/ O cinza”, em O Cinza. Ou ainda: “Eu confesso/ Que gosto das moças do bairro onde moro/ Do estilo indie-hippie-retrô-brasileiro”, em Eu Confesso. Por essas e outras pérolas, afixadas num rock experimental, que O Terno pode ser facilmente colocado na crista da vanguarda da música brasileira.
Filarmônica de Pasárgada – Rádio Lixão
Assim como O Terno, a Filarmônica está em seu segundo disco e vive um momento de constituição de personalidade. O lastro com a USP, de onde vem o principal compositor do grupo, Marcelo Segreto, faz com que a canção seja objeto de estudo e constante reformulação. Neste caso, passa por se apropriar do “lixão”, dos gêneros menos valorizados (como o funk carioca e o axé), para projetar uma música essencialmente provocativa e sarcástica. O risco é ficar refém desta lógica movida por um senso de humor (em tese) rebuscado. Ainda assim, o saldo é muito positivo, principalmente quando a Filarmônica soa “convencional”, em faixas como Cadente, Mil Amigos e Blá Blá Blá (com Tom Zé).