A culpa é das estrelas

Não resisti: fui assistir A culpa é das estrelas. Sabia da fama do livro, mas desconhecia seu conteúdo – não por falta de interesse; era só uma questão de prioridade.... Me avisaram para levar uma quantidade substanciosa de lenços ao cinema. O choro, diziam, era inevitável.

Foto: Divulgação

Fui a uma sessão no meio da semana, no meio da tarde, quando as salas são mais vazias e costumam reunir muitos aposentados e alguns estudantes. Na minha fileira, perto do fundão, havia quase ninguém. O fundão, no entanto, estava repleto de garotos e garotas – bem mais garotas, para falar a verdade. Com a projeção iniciada, elas reagiam intensamente a cada conflito e novidade deflagrados na tela. Era um misto de reações: suspiros apaixonados, risadas tímidas, gargalhadas e, claro, rios de lágrimas. Perto do fim do filme, até achei que deveria perguntar se estava tudo bem, tamanho a dor do soluçar das meninas. Segurei a compaixão deliberada. Chorar faz bem, pensei.

Antes que você me ache um insensível, um macho sem coração, também tive de lidar com algumas lágrimas que vazaram dos meus olhos, além daquele nó apertado na garganta. Mas nada que me levasse aos prantos e obrigasse a disfarçar o inchaço dos olhos na saída do cinema. Quando o drama perde nas sutilezas, tendo a ficar mais sóbrio. Começo a desconfiar daquele jogo sentimental exagerado. A desgraceira chega a ficar cômica a certa altura.

A culpa é das estrelas, por sinal, é uma ladeira sem fim de desgraças. Tudo começa relativamente bem, é claro. O contexto é a pós-adolescência, quando amores mais concretos começam a aparecer. Hazel, a garota, encontra Gus, o garoto, num grupo de apoio para pacientes com câncer. Ela não tem mais muito tempo de vida. Ele teve uma perna amputada e, aparentemente, começa a desfrutar de uma vida distante da doença.

Dessa amizade casual nasce um romance encantador. Com receio da morte que se aproxima, ela procura estabelecer uma relação que seja apenas “amizade”. Ele, no entanto, não esconde sua paixão: quer tê-la como namorada. Aos poucos, os dois cristalizam um relacionamento franco e muito bonito. O auge é quando partem para uma viagem a Amsterdã, na Holanda.

Enquanto acompanhamos este enamorar irresistível do casal, lembramos dos seus prazos exíguos. A morte irá bater na porta em algum momento. Queremos evitar a tragédia, mas sabemos que ela virá com toda sua insensatez. Como veio com Romeu e Julieta. Não vou bancar o spoiler e adiantar as reviravoltas. São elas que dão sustância ao drama.

Se você levar sua análise para um lado mais cinematográfico, poderá se decepcionar. A culpa é das estrelas é convencional em sua narrativa, interpretações e opções estéticas. Mas se você se deixar levar pela história, não há como evitar o apreço por jovens tão autênticos em suas escolhas. Alguém irá contestar este lado “poliana” dos protagonistas. Não vejo por aí: esta opção por um “amor verdadeiro” me parece o que há de mais rebelde num mundo tomado por relações fragmentadas e fúteis. Isso inclui também a medida exata de aproximação e cumplicidade com os pais.

Quando estão em Amsterdã, Hazel e Gus vão ao museu de Anne Frank. Esta passagem contém os momentos mais poéticos do filme. Ali também está a chave para entender a jornada de Hazel. É quando a vida ganha um sentido mais pleno. É quando até a dor, por mais doída que seja, chega a parecer mesquinha diante de certos flagelos da humanidade.

A culpa é das estrelas merece ser visto. Agradeço e recomendação e passo à frente: leve lenços!

 

 

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Sobre

Pitacos, reflexões e provocações sobre música, cinema, jornalismo, cultura pop, televisão e modismos.

Autores

Emanuel Bomfim

Emanuel Bomfim nasceu em 1982. É radialista e jornalista. Escreve para revista Cidade Nova desde 2003. Apresenta diariamente na Rádio Estadão (FM 92,9 e AM 700), em SP, o programa 'Estadão Noite' (das 20h às 24h). Foi colaborador do 'Caderno 2', do Estadão, entre 2011 e 2013. Trabalhou nas rádios Eldorado, Gazeta e América.