A prevalência do uso de drogas continua estável em todo o mundo, de acordo com o Relatório Mundial sobre Drogas de 2015 do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC), divulgado nesta sexta-feira (26), na sede da entidade, em Viena (Áustria).
Cerca de 246 milhões de pessoas usaram drogas ilícitas em 2013, afirma novo relatório da ONU. Foto: Divulgação
Estima-se que um total de 246 milhões de pessoas – um pouco mais do que 5% da população mundial com idade entre 15 e 64 anos – tenha feito uso de drogas ilícitas em 2013. Cerca de 27 milhões de pessoas fazem uso problemático de drogas, das quais quase a metade são pessoas que usam drogas injetáveis (PUDI). Estima-se que 1,65 milhão de pessoas que injetam drogas estavam vivendo com HIV em 2013. Homens são três vezes mais propensos ao uso de maconha, cocaína e anfetamina, enquanto que as mulheres são mais propensas a usar incorretamente opioides de prescrição e tranquilizantes.
Discursando no Dia Internacional contra o Abuso e o Tráfico Ilícito de Drogas, o diretor executivo do UNODC, Yury Fedotov, observou que, embora o uso de drogas esteja estável no mundo, apenas uma de cada seis pessoas que fazem uso problemático de drogas tem acesso ao tratamento. “Mulheres, em particular, parecem enfrentar mais barreiras para ter acesso ao tratamento – enquanto, mundialmente, um em cada três usuários de drogas é mulher, apenas um em cada cinco usuários de drogas em tratamento é mulher.”
Além disso, Fedotov declarou que é necessário trabalhar mais para promover a importância de se entender e abordar a dependência como uma condição crônica de saúde a qual, assim como diabetes ou hipertensão, requer tratamento e cuidados sustentados a longo prazo. “Não existe um remédio rápido e simples para o uso problemático de drogas e precisamos investir, a longo prazo, em soluções médicas baseadas em evidências.”
O uso de drogas e seu impacto na saúde
Um número estável, mas ainda inaceitavelmente alto, de usuários de drogas continua perdendo suas vidas prematuramente em todo o mundo, diz o diretor do UNODC, que estima um total de 187.100 mortes relacionadas com as drogas em 2013.
O Relatório Mundial sobre Drogas inclui dados – levantados em conjunto com o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (UNAIDS), a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Banco Mundial – sobre a prevalência do HIV entre PUDI. Em alguns países, mulheres que injetam drogas são mais vulneráveis à infecções por HIV do que os homens, e a prevalência do HIV pode ser maior entre as mulheres que injetam drogas do que entre suas contrapartes masculinas. O número de novas infecções por HIV entre PUDI diminuiu aproximadamente 10% entre 2010 e 2013: de uma estimativa de 110 mil para 98 mil.
Entretanto, o Relatório Mundial sobre Drogas também indica que muitos fatores de risco, incluindo a transmissão de doenças infecciosas como o HIV e a hepatite C e a incidência de overdose por drogas, fazem com que o índice de mortes entre PUDI seja 15 vezes maior do que no resto da população.
Enquanto os dados indicam que o uso de opioides (heroína e ópio) continua estável em nível mundial e que o uso de cocaína diminuiu globalmente, o uso de maconha e o uso não medicinal de opioides farmacêuticos continuam crescendo. Evidências sugerem que mais pessoas estão sofrendo consequências decorrentes do uso da maconha e que a maconha pode estar se tornando mais prejudicial, como refletido pela alta proporção de pessoas procurando tratamento pela primeira vez em várias regiões do mundo.
A demanda por tratamento também aumentou para tipos de estimulantes baseados em anfetamina (ATS, na sigla em inglês) – incluindo metanfetamina e MDMA ou “Ecstasy” – e para novas substâncias psicoativas (NSP), também conhecidas como “drogas legais”.
Fornecimento e mercados de drogas ilegais
Em torno de 32,4 milhões de pessoas – ou 0,7% da população adulta do mundo – usam opioides farmacêuticos e opiáceos como a heroína e o ópio. Em 2014, o potencial de produção mundial de ópio alcançou 7.554 toneladas – o segundo maior nível desde a década de 1930, principalmente devido ao aumento significativo do cultivo no Afeganistão, o principal país produtor. A apreensão global de heroína, por sua vez, aumentou em 8%, enquanto a apreensão de morfina ilícita diminuiu em 26% de 2012 a 2013.
Enquanto o tráfico marítimo não é a prática mais amplamente utilizada para o contrabando de drogas, operações de aplicação da lei no mar tem potencialmente apresentado o melhor impacto uma vez que a média de volumes apreendidos é proporcionalmente maior. No período de 2009 a 2014, por exemplo, a média para cada apreensão pelo mar foi de 365Kg, enquanto por terra (em rodovias e ferrovias) foi de 107Kg e por ar de 10Kg.
O Relatório Mundial sobre Drogas de 2015 também observa uma mudança na dinâmica das rotas usadas para contrabando de opiácios, com a heroína afegã alcançando novos mercados. Apreensões recentes sugerem que, talvez, tenha se tornado mais comum para grandes carregamentos da heroína afegã serem contrabandeados através do Oceano Índico para o leste e o sul africano. Países africanos ocidentais continuam a servir de áreas de transbordo para o contrabando de cocaína através do Atlântico para a Europa, e países do leste europeu estão emergindo como uma área de trânsito e como um destino dessa droga.
Desenvolvimento alternativo como uma estratégia em longo prazo contra cultivos ilícitos
O foco temático do Relatório Mundial sobre Drogas de 2015 é o desenvolvimento alternativo, uma estratégia em longo prazo que visa desenvolver fontes alternativas de renda para camponeses que dependem do cultivo de drogas ilícitas. Essa atividade é impulsionada por vários fatores, incluindo a marginalização, a falta de segurança e a situação política e social das comunidades rurais. O desenvolvimento alternativo visa reduzir essas vulnerabilidades e, enfim, eliminar o cultivo de drogas ilícitas.
Mais de 40 anos de experiência tem demonstrado que essa abordagem funciona quando existe uma visão em longo prazo, financiamento adequado e suporte político para integrar o tema em um desenvolvimento mais amplo e na agenda de governança. A comercialização de produtos lícitos, a posse de terra e o gerenciamento e uso sustentável da terra são cruciais para o sucesso em longo prazo das intervenções do desenvolvimento alternativo.
“Infelizmente, o Relatório Mundial sobre Drogas desse ano também demonstra que o suporte político amplamente difundido para o desenvolvimento alternativo não tem sido seguido pelo suporte financeiro”, acrescenta o Fedotov, enquanto pede para que a responsabilidade quanto às drogas ilícitas seja compartilhada.
O financiamento proveniente dos países da OCDE para apoiar o desenvolvimento alternativo diminuiu em torno de 71% entre 2009 e 2013, totalizando apenas 0,1% da assistência para o desenvolvimento global. O diretor executivo do UNODC observou que, na direção da Sessão Especial da Assembleia Geral da ONU do próximo ano sobre o problema das drogas, a Agenda de Desenvolvimento pós-2015 da comunidade internacional pode ajudar a promover esforços de desenvolvimento alternativo, o qual amplia intervenções com relação a oferta e a demanda de drogas.
A íntegra do Relatório Mundial sobre Drogas – em inglês – encontra-se disponível aqui: http://goo.gl/RRYSRt