O projeto Mão na Massa abriu nesta semana as inscrições para mulheres que queiram fazer cursos gratuitos na área da construção civil no Rio de Janeiro. São ao todo 140 vagas para cursos de pedreira, encanadora, pintora e eletricista. As aulas começam no dia 27 de abril.
Segundo Deise Gravina, idealizadora do projeto "Mão na Massa", as mulheres são mais econômicas, mais organizadas e mais atentas ao uso de equipamentos de segurança do trabalho. Foto: Divulgação
Haverá duas turmas nos períodos da manhã e tarde, durante seis meses. Nos últimos sete anos, quase mil mulheres foram capacitadas no projeto. As aulas de qualificação social são dadas no Abrigo Maria Imaculada, no Rocha, zona norte da cidade. As inscrições vão até o dia 15.
A idealizadora do projeto, a engenheira civil Deise Gravina, disse que mais de 60% das mulheres formadas pelo Mão na Massa estão empregadas no mercado formal. Entre as mudanças promovidas pela presença feminina no canteiro de obras, a engenheira disse que as mulheres são mais econômicas, mais organizadas e também mais atentas em relação ao uso de equipamentos de segurança do trabalho.
“Elas conseguem mudar a cultura do canteiro porque os homens tendem a se comportar melhor, a ter melhores atitudes. Como elas entram como técnicas, muitos homens voltaram a estudar. Há um aumento da escolaridade, melhoria da postura”. Segundo Deise, não existe preconceito dos homens quanto à participação de mulheres nas obras.
Pesquisa efetuada pelos organizadores do projeto com 216 mulheres da Comunidade Rato Molhado, no Engenho Novo, zona norte da capital fluminense, mostrou que quase 80% das entrevistadas consideraram que a construção civil seria uma opção de aprendizagem, pois já faziam pequenos serviços.
Deise explicou que, nas comunidades, os homens estão acostumados que suas mães, irmãs e mulheres façam serviços de obras para ajudá-los a erguer, por exemplo, um quarto na casa. “Sempre foi a mulher que fez esse papel de servente de obra em pequenos consertos, pinturas, batendo uma laje”.
Para se inscrever no projeto, as candidatas de baixa renda devem ter entre 18 e 45 anos e ter, pelo menos, o 5º ano do ensino fundamental e passam por entrevistas no momento da inscrição. Nos dois primeiros meses, elas recebem aulas teóricas de cidadania, português e matemática voltados para a construção civil, postura, ginástica laboral, nutrição, direitos, segurança do trabalho e sobre a Lei Maria da Penha.
Na segunda fase do curso, elas têm aulas práticas no canteiro de obras no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) ou na Fundação de Apoio à Escola Técnica (Faetec), quando têm contato com a obra em si. Na última fase de estágio, elas vão fazer obras de verdade em entidades beneficentes, “para devolver para a sociedade o que a sociedade investiu nelas”. Nesta etapa, elas são acompanhadas por engenheiros, arquitetos e técnicos de edificações que dão os últimos toques para que elas estejam prontas para o mercado.
Segundo Deise, hoje há mulheres que, após deixarem o projeto, têm salário de R$ 3 mil e algumas são encarregadas de obras. Ela diz que o projeto é um cartão de apresentação no mercado, um diferencial.
Ana Carla Silva Braz fez a primeira edição do curso, em 2008. Para ela, a experiência foi muito importante. “O Mão na Massa me abriu as portas, porque eu estava há cinco anos desempregada, mesmo sendo professora. Depois disso, não fiquei mais sem emprego. Até hoje estou trabalhando em obra”. Atualmente, Ana Carla presta serviço em uma empreiteira terceirizada da construtora Odebrecht como bombeira hidráulica.
Segundo a profissional, ainda hoje causa espanto no sexo masculino a presença de mulheres nos canteiros de obras. “Tem homem que ainda não caiu a ficha. Eles ficam muito surpresos”. Ela acredita, porém, que, aos poucos, os homens vão se acostumar e que o número de mulheres vai ser cada vez maior.
Ana Carla continua estudando. Acabou de fazer o curso de desenho de arquitetura em edificações e faz, no momento, o último módulo de edificações. “O meu objetivo é me aprofundar mais dentro da minha área”.
Ivaneide Barbosa dos Santos qualificou-se como pedreira na última turma do projeto, no ano passado. “Para mim foi a realização de um sonho. Estou aprendendo cada vez mais”. Ela trabalha na construtora MRV e não tem dúvidas de que a mulher está capacitada para a atividade. No primeiro mês de trabalho, Ivaneide foi eleita funcionária padrão. “Dou tudo de mim, do que eu aprendi, e tenho muito mais ainda que aprender. Com certeza, a mulher está aí para arrasar na construção civil”.
O exemplo de Ana Carla e Ivaneide motivou Maria Lucilene Costa de Paula e Priscila Soares Pereira Agra. Elas estão entre as centenas de mulheres que se inscreveram para participar do projeto. Lucilene disse ter experiência em obra, por necessidade. Ela construiu a casa da filha e está agora buscando aprimoramento e investir mais em sua capacidade, com o objetivo de construir a casa da mãe “e reformar a minha”.
Lucilene está desempregada e quer ter uma nova profissão. Tem curso de hotelaria e, enquanto aguarda contratação, vende roupas. Priscila vê o projeto como uma oportunidade de se profissionalizar e voltar aos estudos, que não concluiu. Atualmente, é dona de casa. Caso seja aprovada para fazer o curso, pretende ser pedreira. “Quem tiver força de vontade, consegue. Tem que querer, ter confiança no que a gente faz e tem que ter segurança também, que é muito importante”.