Durante os últimos três anos, pesquisadores do Centro de Tecnologia Mineral (Cetem) do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação estudaram 105 territórios em 22 estados brasileiros que sofreram impactos da mineração e confirmaram que a extração de minerais é uma atividade “extremamente impactante nas regiões onde está instalada. Ela gera um conjunto de consequências ambientais e socioeconômicas”, diz o pesquisador do Cetem Francisco Rego Chaves Fernandes.
Mineração - Santa Maria de Itabira (MG). Foto: Mídia Ninja (30/09/13)
A pesquisa resultou no livro Recursos Minerais e Comunidade: Impactos Humanos, Socioambientais e Econômicos, que pode ser baixado na internet para consulta na página do Cetem. Francisco Fernandes relatou que as consequências são verificáveis em termos de queixas das populações, danos à flora, à fauna e à água e poeira no ar.
Doutor em engenharia mineral, Fernandes explica que uma das questões ambientais mais complicadas nos territórios de mineração diz respeito à água, pois “o reuso dela ainda é um sonho e as práticas de sustentabilidade estão muito atrasadas”. Ele lembrou que o Brasil depende hoje de um modelo exportador que gera riqueza e reservas importantes para o país, mas, ao mesmo tempo, os territórios acabam sendo fragmentados com isso. “Há um conflito muito grande porque o país tem muitas áreas sensíveis, como as indígenas, as de populações tradicionais, como os quilombolas, e as de preservação ambiental, o que resulta em muitas queixas”.
Fernandes destacou o papel importante desempenhado pelo Ministério Público Federal (MPF), que tem exigido que as mineradoras se comportem o mais possível dentro de boas práticas sustentáveis. “Mas esse é um caminho muito longo. A impressão que dá é que somos muito permissivos com isso”. Segundo ele, em muitos países, além de uma licença ambiental, exige-se que a atividade mineradora negocie previamente uma licença social com a população do território onde pretende se instalar.
Há no Brasil, conforme Fernandes, “uma licença ambiental pouco fiscalizada e bastante frouxa e nenhuma licença social, e a mineração parece ter predominância sobre tudo e sobre todos”. O resultado apresenta, de um lado, montanhas de dólares e de outro, cidades inchadas como Carajás, no Pará, principal empreendimento minerador brasileiro, que em dez anos viu a sua população crescer 300%. Em contrapartida, os serviços de infraestrutura, entre os quais se destaca o saneamento básico, são precários, afirma o pesquisador.
Um abuso detectado em territórios indígenas são os garimpeiros que entram para pegar ouro e diamantes e os assoreamentos provocados nos rios por materiais para uso imediato da construção civil. A produção é de baixíssimo teor de ouro, porque 1 tonelada de terra tem apenas 1 grama de ouro. “Isso é feito com água, com produtos químicos”, segundo Fernandes.
De acordo com o estudo, estão em funcionamento no país 3 mil minas e 9 mil mineradoras, além de uma centena de garimpos legais e clandestinos. O setor mineral emprega cerca de 200 mil trabalhadores e responde por 4% do Produto Interno Bruto (PIB), que é a soma de todos os bens e serviços produzidos no país. Os investimentos programados pelo setor somam US$ 75 bilhões entre 2012 e 2016.
Pelo estudo, os estados com maiores problemas são Minas Gerais e Pará, “que são os maiores produtores de substâncias minerais metálicas, como ouro, zinco, chumbo, minério de ferro e bauxita, que é o minério do alumínio, cujos problemas são mais complicados”.
Fernandes acredita que o estudo poderá servir de subsídio ao Congresso Nacional para a votação do marco mineral brasileiro: “É importante quando se mostram os impactos socioeconômicos da mineração”. O livro levanta questões como empobrecimento, aumento da prostituição e, em alguns casos, trabalho infantil em regiões como Marabá, no Pará, onde crianças e jovens na faixa de 12 a 14 anos são colocados para trabalhar com carvão vegetal para produção de ferro-gusa. Sem falar nos impactos ambientais, com destaque para poluição da água, assoreamento dos rios, desmatamento, erosão, mudança da paisagem do solo e danos à flora e à fauna.
Segundo o pesquisador, o estudo pode subsidiar também o MP, associações e movimentos sociais que tratam dessas questões, e caminhar para casos de sucesso, que seriam acordos entre mineradoras e comunidades afetadas para que a atividade fosse sustentável ou controlável.
Nesse sentido, ele destacou o acordo firmado entre a empresa Alcoa e a população ribeirinha do município paraense de Juruti, após intenso conflito. A mineradora investiu US$ 1 bilhão no empreendimento e a contrapartida para os moradores somou US$ 40 milhões, sob a forma de escolas, hospital e ações de empreendedorismo, que criaram uma economia local que gera renda e emprego na própria região.
Procurado para comentar o estudo, o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), representante das empresas e instituições que atuam no setor, está em recesso de 22 de dezembro até 4 de janeiro próximo.