Com receio de soar repetitivo e de não conseguir acrescentar muitos elementos ao debate, arrisco nas próximas linhas uma tentativa de interpretar os resultados eleitorais no Parlamento Europeu. Para quem não está muito a par da situação, houve um avanço grande e difuso de partidos do que se chamou de extrema-direita.
Trata-se de grupos declaradamente discriminatórios que assumem posições contrárias a homossexuais, à presença de estrangeiros em seus países e são contrários à existência da União Europeia. Alguns deles abarcam correntes anti-semitas. Para se ter uma ideia, Jean-Marine Le Pen, a líder do partido xenófobo francês Frente Nacional, chegou a afirmar que "o senhor Ebola poderia resolver o problema demográfico da África". É inegável que ventos nacionalistas sopram cada vez mais forte no Velho Continente e que algumas minorias, como estrangeiros e homossexuais, têm muito a perder se o avanço político de correntes como essas aumentar. O partido de Pen, com 25% dos votos, foi o maior vencedor na França. O partido do presidente Francois Hollande somou meros 14% dos votos. Algo semelhante se viu na Inglaterra, onde o Ukip, partido criado com o intuito de retirar o Reino Unido da UE, arrebatou 28% das cédulas.
A inquietude com o resultado das urnas é visível dentro e fora do continente. Como é possível que a Europa no século XXI dê ouvidos a doutrinas excludentes que deixaram uma marca de horror em sua história recente? Interrogar-se a esse respeito é inevitável, mas talvez seja também pouco produtivo. Mais do que a perplexidade, interessa saber o que os cidadãos europeus querem dizer com suas preferências políticas manifestadas no último domingo.
O que eles têm a dizer? O que está por traz desse sinal de retrocesso? Essas perguntas talvez nos levem a resultados mais pertinentes ao momento atual. Elas revelam algo mais profundo e que muitas vezes parece ser negligenciado pelos amantes da democracia, da inclusão e da integração. Não basta ser abrangente. Não é suficiente instaurar princípios democráticos e estabelecer regras e instituições com base nesses princípios. É necessário mostrar resultados.
A insatisfação com a política de austeridade imposta em todo o bloco produziu efeitos colaterais importantes. Uma Europa que gasta menos tornou-se um continente com menos investimentos, menos dinamismo econômico. Os efeitos disso tudo são sentidos no bolso e no dia a dia de seus habitantes. Como lembra Robert Dahl, os críticos da democracia estarão sempre lá para dizer que “um processo de tomada de decisões coletivo, não importa quão democrático, não se justifica a não ser que gere – ou tenda a gerar – resultados desejáveis”. Isto não vale somente para a democracia, mas também para processos de integração como a União Europeia.
Não basta levantar a bandeira da inclusão das minorias étnicas ou mesmo da democracia. É preciso mostrar que elas são compatíveis com o desenvolvimento e produzem bons resultados. A Europa demanda isso quando flerta com correntes de outra natureza. Aos defensores das conquistas do Ocidente, cabe o ônus de provar que elas são compatíveis com os objetivos básicos perseguidos por uma sociedade. Cabe também a ressalva de que, por enquanto, os partidos da dita extrema direita somam apenas 14% das cadeiras do Parlamento Europeu, apesar do crescimento vertiginoso que registraram na última semana. Por enquanto o que se tem é apenas um espectro. Mas assusta.