Vinte anos após o início das mobilizações contra a fome articuladas pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, que levaram à criação do Comitê de Entidades no Combate à Fome e Pela Vida (Coep Nacional), um encontro nacional começa a discutir, a partir de amanhã (9), no Rio de Janeiro, o saldo da atuação durante o período e os desafios para os próximos cinco anos. O evento foi antecedido por discussões prévias que apontam para o avanço do país na luta pela erradicação da miséria.
Apesar dos avanços, o Brasil ainda luta pela universalização dos direitos sociais e pela redução da violência contra a mulher e a juventude, em especial a juventude negra. Foto: H Dominique Abed/Free Images
Em entrevista concedida ontem (8) à Agência Brasil, a secretária executiva do Coep Nacional e coordenadora-geral da Rede Mobilizadores, Gleyse Peiter, disse que a análise dos resultados mostra que não ocorreram retrocessos, ou seja, nesses 20 anos, houve a consolidação das conquistas alcançadas. O Encontro Nacional 20 Anos de Avanços e Desafios na Promoção da Cidadania no Brasil será aberto no auditório de Furnas, em Botafogo, zona sul do Rio de Janeiro, e se estenderá até quarta-feira (10).
Os formadores de opinião ouvidos pelo Coep Nacional para avaliar as conquistas obtidas nos 20 anos de mobilização social e ver o que ainda tem de ser feito acreditam que o Brasil avançou muito na área da erradicação da miséria. O primeiro grande desafio nesse campo, porém, é a universalização dos direitos sociais e também o combate à violência contra a mulher e a juventude, em especial a juventude negra.
Em termos de direitos e cidadania, embora o país tenha elaborado muitas políticas, é preciso ainda consolidá-las, “principalmente para a população como um todo”, salientou Gleyse Peiter. Ela tambeem disse que "nem todos têm seus direitos respeitados” e citou o exemplo da população carcerária, os direitos humanos à alimentação, os direitos à participação e ao trabalho, que constam da Constituição, mas não são efetivados. “Esses direitos, embora existam, precisam ser consolidados e estendidos para todo mundo”.
O encontro vai abordar também as vulnerabilidades em relação às mudanças do clima. Gleyse Peiter informou que, nos últimos 20 anos, o que se percebeu é que as populações mais pobres tiveram menos chance de se preparar para as alterações climáticas: “precisamos discutir adaptação. Os desafios passam pelo fortalecimento das populações, para que elas possam ser resilientes aos impactos das mudanças climáticas”. Ela Lembrou, ainda, que as populações indígenas sofrem bastante com o problema do clima, além dos pequenos produtores.
A proposta do evento é a construção de uma agenda de mobilização e sensibilização, com atividades que contribuam para a superação desses desafios de alguma forma. Gleyse observou que, no campo da mobilização social, a responsabilidade deve ser repartida entre governo e sociedade. Para ela, é preciso uma capacitação cidadã para que as pessoas possam exercer a participação social e o controle das políticas públicas.
Os debates já efetuados concluíram que é preciso transformar programas de governo em políticas de Estado, “se não, tem um retrocesso”, acentuou Gleyse. Como atua como uma rede de mobilizadores, o Coep Nacional pode tentar sensibilizar governo e sociedade, por meio da promoção de seminários, fóruns, oficinas. “Qual é o nosso papel em relação à política pública, além de preparar as pessoas para participar desse controle social? O que a gente faz para conseguir isso?”, indagou. A resposta é, segundo Gleyse, “mostrar que a gente quer [isso], também”.