A Exortação apostólica Pós-Sinodal Christus Vivit apresenta o pensamento lúcido e coerente de Francisco, inspirado em reflexões de jovens e dos bispos que participaram do Sínodo da Juventude, a respeito do protagonismo juvenil na vida da Igreja e no testemunho do Evangelho. Pensando no calendário litúrgico da Igreja para agosto, é oportuno apontar o que diz o papa na Christus Vivit a propósito da vocação, compreendida, em linhas gerais, como o chamado de Deus à vida plena. Isso significa ir além de estados específicos como o matrimônio, a vida sacerdotal, consagrada ou outro.
Para o papa, a referência fundamental de toda vocação é o próprio Jesus, cuja história é o modelo por excelência de realização humana. Essa, por sua vez, tem uma medida clara: “a nossa vida na terra alcança a sua plenitude quando se converte em oferenda”. Isso significa que Deus nos chama a dar continuidade à Sua obra criadora mediante o encontro e serviço ao outro. A vocação, portanto, está diretamente condicionada à nossa capacidade de relação profunda com o semelhante.
Ao refletir sobre duas questões básicas que relacionam a vida do jovem ao tema da vocação – uma nova família e o trabalho -, Francisco aponta para a postura radical de Cristo ao abraçar esse chamado, isto é, a atitude de quem investiu tudo nas relações humanas, comprometendo-se até as últimas consequências. Por isso, ele alerta para o perigo da “cultura do provisório” ou “do relativo”, segundo a qual “o importante é ‘desfrutar’ o momento”, já que não valeria “a pena comprometer-se para toda a vida, fazer opções definitivas”.
O papa desafia os jovens a não se limitarem a uma vida individualista que, “por fim, conduz ao isolamento e à pior solidão”. Por essa razão, é necessário preparar-se para o matrimônio, educar-se a desenvolver as melhores virtudes, como o amor, a paciência, a capacidade de diálogo e serviço. “Também implica educar a própria sexualidade, para que seja cada vez menos um instrumento para usar os outros e cada vez mais uma capacidade de se entregar plenamente a uma pessoa, de modo exclusivo e generoso.”
Reflexão semelhante faz Francisco a respeito do trabalho. Para além de uma questão de sobrevivência material, a atividade laboral é condição para a construção da identidade da pessoa porque – entre outras atribuições – permite ao jovem sua inserção na vida em sociedade. Embora, hoje, muitos jovens experimentem formas de exclusão e marginalização no âmbito do mercado - o que é preciso ser combatido -, em termos potenciais, o trabalho é “uma proteção ante a tendência para o individualismo e para a comodidade”, argumenta o papa.
A visão cristã da vocação transcende, afinal, a própria pessoa, ainda que a resposta a esse chamado seja individual. Aliás, ela se delineia mediante uma relação com Deus. Desse modo, é uma resposta que não pode se limitar a algo acidental, uma escolha pragmática e tampouco se refere apenas a fazer coisas. Trata-se, diz Francisco, de uma “resposta a um chamamento que ressoa no mais profundo do ser, para dar alguma coisa aos outros”.