A PALAVRA de Vida deste mês encontra-se na oração que Jesus ensinou a seus discípulos, o Pai-Nosso. É uma oração profundamente enraizada na tradição judaica. Também os judeus chamavam e chamam Deus de “Pai nosso”. Numa primeira leitura, as palavras desta frase nos cativam: podemos pedir a Deus que Ele perdoe nossas dívidas – como sugere o texto grego – da mesma forma como nós mesmos conseguimos perdoar aqueles que apresentam alguma pendência contra nós? Nossa capacidade de perdão é sempre limitada, superficial, condicionada.Se Deus nos tratasse de acordo com a nossa medida, isso significaria uma verdadeira condenação!
“Perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores.”
Não é uma condenação. São palavras importantes que expressam, antes de tudo, a consciência de que precisamos do perdão de Deus. Foi o próprio Jesus que as transmitiu aos discípulos e, portanto, a todos os batizados, para que, por meio delas, eles possam se dirigir ao Pai com simplicidade de coração.
Tudo começa ao descobrirmos que somos filhos no Filho, irmãos e imitadores de Jesus, que foi o primeiro a fazer de sua vida um caminho de adesão cada vez mais total à vontade amorosa do Pai.
Só depois de termos acolhido o dom de Deus, seu amor sem limites, é que podemos pedir tudo ao Pai, inclusive que nos torne cada vez mais semelhantes a Ele, até mesmo na capacidade de perdoar os irmãos e irmãs com um coração generoso, dia após dia.
Cada ato de perdão é uma escolha livre e consciente, que deve sempre ser renovada com humildade. Nunca se torna um hábito; é uma conquista exigente. Jesus quer que rezemos por essa conquista todos os dias, assim como rezamos pelo pão.
“Perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores.”
Quantas vezes as pessoas com quem vivemos – na família, no bairro, no trabalho ou na escola – podem ter-nos magoado e sentimos dificuldade em retomar um relacionamento positivo. O que fazer? É aqui que podemos pedir a graça de imitar o Pai:
Levantemo-nos de manhã com uma “anistia” completa no coração, com aquele amor que cobre tudo, que sabe acolher o outro assim como ele é, com suas limitações, suas dificuldades, tal como faz a mãe quando o filho erra: sempre desculpa, sempre perdoa, sempre espera nele... Vamos ao encontro de cada pessoa vendo-a com olhos novos, como se ela nunca tivesse caído naqueles erros. Recomecemos toda vez, sabendo que Deus não só perdoa, mas esquece: é essa a medida que Ele espera também de nós.2
É uma meta alta, à qual podemos nos encaminhar com a ajuda da oração confiante.
“Perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores.”
Além disso, a oração do Pai-Nosso tem, toda ela, a perspectiva do “nós”, da fraternidade: eu peço não só por mim, mas também pelos outros e com os outros. Minha capacidade de perdão é sustentada pelo amor dos outros e, por outro lado, meu amor pode de alguma forma sentir o erro de meu irmão como se fosse meu: talvez seja algo que também depende de mim, talvez eu não tenha feito toda a minha parte para que ele se sentisse acolhido, compreendido...
Em Palermo, uma cidade italiana, as comunidades cristãs vivem uma experiência intensa de diálogo, o que exige a superação de algumas dificuldades. Brás e Zina contam: Um dia, um pastor amigo nosso nos convidou a visitar algumas famílias de sua Igreja que não nos conheciam. Tínhamos levado alguma coisa para compartilhar no almoço, mas aquelas famílias nos deram a entender que não viam esse encontro com bons olhos. Com delicadeza, Zina os fez experimentar algumas das especialidades que ela havia preparado. Acabamos almoçando juntos. Após o almoço, eles começaram a apontar as falhas que viam em nossa Igreja. Não querendo entrar numa guerra verbal, dissemos: qual desses defeitos ou diferenças entre as nossas Igrejas pode nos impedir de nos querermos bem? Acostumados a constantes discussões, eles ficaram espantados e desarmados diante de uma resposta dessas e começamos a falar do Evangelho e daquilo que nos une, o que certamente é muito mais do que aquilo que nos divide. Quando chegou a hora de nos despedirmos, eles não queriam nos deixar ir embora. Nesse momento, sugerimos a oração do Pai-Nosso, durante a qual sentimos uma presença muito forte de Deus. Eles nos fizeram prometer que voltaríamos, porque queriam que conhecêssemos o resto da comunidade. É o que temos feito ao longo de todos esses anos.