QUANDO a pandemia teve início, padre Antônio Capelesso, de 73 anos, se viu diante de novos desafios tecnológicos para continuar sua rotina religiosa. Primeiro, surgiu a necessidade de transmitir as missas pelo Facebook e depois pelo Youtube, o que incluía dominar o uso do programa de transmissão e ainda montar o roteiro da celebração com o texto salvo em formato imagem. Com o passar do tempo, veio também a demanda de saber editar vídeos para depois enviá-los ao canal on-line, além de dar aquela melhorada na aparência do seu perfil na rede social. “Um recente aprendizado foi a descoberta de fones de ouvido sem fio. Realizamos várias lives com outros sacerdotes do Brasil, especialmente no domingo à noite, e este pequeno aparelho trouxe mais comodidade e facilidade na comunicação”, conta.
Aprender tudo isso só foi possível graças a um projeto intitulado “A vós Conectados” lançado pelos Jovens por um Mundo Unido, juventude ligada ao Movimento dos Focolares, que capitaneou voluntários para auxiliar pessoas da terceira idade com suas dúvidas tecnológicas, dentre elas como realizar uma vídeo chamada, criar um perfil em redes sociais, fazer exercícios físicos com aplicativos virtuais ou até mesmo realizar o cadastro para o auxílio emergencial.
“No início da pandemia, houve um processo repentino e forçado de digitalização que excluía muitas pessoas sem familiaridade com os meios digitais. Vimos que podíamos ajudar de alguma forma, passando nosso conhecimento”, destaca Lucas Bandeira, de 30 anos, um dos jovens idealizadores.
Desde o ano passado, o projeto já envolveu mais de 30 voluntários e quase 80 pessoas receberam treinamentos virtuais pessoais, por meio de agendamento, incluindo o padre Capelesso. “O contato com os jovens sempre traz muito enriquecimento pessoal”, completa.
Dentre os voluntários, está a jovem Raquel Valente, do Espírito Santo, que decidiu se voluntariar ao perceber o quanto as chamadas de vídeo faziam bem aos pais e aos avós durante o período de isolamento. “Naquele momento das chamadas, eles podiam esquecer um pouco de toda a situação da pandemia”.
No contato com os idosos e idosas, Valente descobriu que o que parecia tão intuitivo para ela não parecia para uma geração diferente, como o ícone do disquete significar a opção de salvar um documento ou mesmo um “X” significar que sempre é possível fechar. “Aprendi a ter mais paciência, a ser didática e ensinar algo que era óbvio para mim, mas sobre o que a outra pessoa não tinha parado para pensar ainda”, destaca a jovem.
Raquel Valente pôde compartilhar seus conhecimentos com a curitibana Beatriz Perez, de 67 anos. Acostumada a participar de reuniões presenciais, de uma hora para outra, sem computador e apenas com o celular, Perez se viu diante de muitas dificuldades para instalar e abrir aplicativos de reuniões virtuais, para utilizar todos os recursos do WhatsApp e, com a enxurrada de mensagens, para “limpar” a memória do celular, que estava sempre cheia.
“Sozinhos não conseguimos e nossos familiares não têm muito tempo. Temos que aceitar que somos mais devagar e que os jovens estão mais preparados. Me senti muito bem com eles e muito bem atendida. Se não fosse por essa ajuda, não estaria acompanhando as reuniões”. E completa: “Vocês não podem parar porque a terceira idade precisa muito dos jovens”.
Marina Cavalcante, de Fortaleza, não tem dúvidas de que a recíproca é verdadeira. Entusiasta da tecnologia como uma ferramenta de aproximação entre as pessoas, Cavalcante faz questão de destacar o quão incrível foi poder ajudar uma pessoa de outro estado somente pelo celular. “Gosto de novas tecnologias por facilitar a vida e aproximar as pessoas.” A jovem encontrou no projeto uma forma de “sair um pouco da zona de conforto”, como ela mesma comentou. “A experiência foi fantástica e muito divertida. Pude ensinar as pessoas coisas que provavelmente elas não teriam como aprender e tive um espaço para usar minha criatividade para ensinar sobre Instagram, Spotify e, no fim, eu também acabei aprendendo outras coisas”, diz.
Tempos depois, espontaneamente, Cavalcante lembrou de enviar para uma das participantes do projeto outro vídeo sobre o Instagram. “A partir de então, de vez em quando, ela também me manda mensagens. Foi uma troca, e agora ela sabe que não foi uma coisa pontual, que sempre que ela tiver uma dúvida, ela pode me enviar”, conta.
Dos relatos se extrai o que de fato foi a essência da origem do projeto: um frutuoso relacionamento entre gerações, baseado em diálogo, paciência e compreensão mútua. “O aprendizado principal é que, mais do que passar um passo a passo ou um tutorial, é necessário estabelecer uma relação e uma comunicação horizontal. É a partir disso que conseguimos quebrar a barreira entre as gerações e nos vermos como iguais”, destaca Bandeira.
Recentemente, o projeto lançou mais uma rodada de inscrições para entender se ainda havia demanda, e cerca de 50 pessoas se inscreveram. Os jovens analisam a possibilidade de tornar iniciativa perene, com um site, tutoriais prontos e um formulário permanente para os interessados.
Para mais informações, acesse este link ou escreva para jpmuavosconectados@gmail.com