Nascida sob a inspiração da operação “Morrer pela própria gente”, do Movimento dos Focolares, entidade atua no atendimento às crianças e aos adolescentes da Vila Aparecida, na zona sul de São Paulo
“... O MOVIMENTO, na sua totalidade, vive uma etapa de novo desenvolvimento sob a fisionomia de Humanidade Nova que, embora timidamente, mas com decisão, colocou-se a serviço da sociedade e de maneira particular dos pobres de hoje: os drogados, os marginalizados, os desempregados, os pecadores, os amorais, aqueles que não creem. E ‘morrer pela própria gente’ é o lema desta operação que espelha e revive aquilo que Jesus fez”.
(LUBICH, Chiara. Jesus naqueles que sofrem.
Versão publicada na seção Cristo no outro, revista Cidade Nova, 1979)
QUANDO os primeiros jovens do Movimento dos Focolares passaram a ir semanalmente, lá para os idos de 1979, ao então bairro da Pedreira, no extremo sul da cidade de São Paulo, jamais imaginavam que aqueles anos iniciais de esforços heroicos resultariam numa obra tão significativa para a comunidade local como se tornou, hoje, a Afago SP (Associação de Apoio à Família, ao Grupo e à Comunidade).
Motivados por Chiara Lubich, que propôs aos jovens do Movimento a operação “Morrer pela própria gente” (cuja proposta era ir ao encontro de Cristo presente nos mais necessitados), alguns membros do grupo, com idades de 15 a 23 anos, aceitaram o convite de uma pessoa dos Focolares que já havia iniciado um trabalho de visita a algumas famílias daquela comunidade, formada, à época, por não mais que 30 famílias, vivendo em barracos, no meio do mato, sem qualquer infraestrutura. Havia apenas um poço, cuja água o proprietário partilhava com elas.
Diante do quadro de extrema vulnerabilidade em que vivam aqueles indivíduos, os jovens propuseram-lhes criar um fundo com recursos para emergências (remédios, comida etc.) a ser administrado por um dos moradores. Durante 5 anos, o grupo se mobilizou para manter essa “caixinha” até que, em 1984, reunido novamente com toda a comunidade, começou a pensar o que era possível fazer para ajudar aquelas famílias a conquistarem melhores condições de vida.
“Desde o início, a gente compreendeu que não deveria chegar na comunidade com um projeto pronto, mas construir algo com os próprios moradores”, explica a artista plástica Adriana Rocha, do grupo que iniciou esse trabalho.
Comunidade Pedreira, 2019 - Arquivo Afago SP
Na assembleia com os moradores, chegou-se ao consenso de que a comunidade tinha duas prioridades: construir uma casa própria para cada família e contar com alguém para cuidar das crianças enquanto os pais estavam no trabalho. A opção viável era tentar cumprir a primeira exigência, mas, nesse caso, seria preciso era “conseguir a grana”. Em grupos de 5 famílias, cada casa seria construída na medida em que os recursos fossem obtidos.
“Aí partimos para as ideias mais criativas possíveis para levantar dinheiro, o que ia de vender adesivos para carro na Avenida Paulista, pedir material de construção nas lojas até realizar festas, bailes”, conta Rocha. Da primeira casa, construída em 1984, até hoje, 750 residências foram feitas pelos próprios moradores em regime de mutirão. Nos últimos anos, o projeto passou a contar com parcerias, como a do Instituto Phi, que já viabilizou, desse total, a edificação de 200 casas.
Em 1993, um novo passo foi dado. Tendo conhecido o Projeto Solidariedade a distância, pelo qual as crianças recebiam ajuda financeira de famílias distantes para cobrir algumas de suas necessidades básicas, a comunidade resolveu criar a Afago SP, cuja identidade jurídica permitiria o acesso aos recursos disponibilizados pelo projeto nascido no âmbito do Movimento Famílias Novas, também ligado aos Focolares. Como não podia contar com sede própria, a Afago SP, mediante uma parceria, passou a utilizar o 2º andar de um salão de uma igreja evangélica.
Nos seus primeiros anos, a entidade sobreviveu “um dia de cada vez”, tendo que contar com doações e o trabalho de voluntários que ofereciam oficinas sobre os mais variados assuntos.
Naquele momento, 30 crianças eram atendidas diariamente, para as quais também era oferecida alimentação. Porém, a partir do momento em que estabeleceu um convênio com a prefeitura de São Paulo, a Afago SP pôde ampliar seus serviços e o público assistido, bem como começou a se profissionalizar. Nove anos depois da fundação da organização, foi possível construir a sede própria e comprar duas outras pequenas casas, onde foram instalados o salão-escola e o laboratório de informática.
HOJE
Grupo de crianças na Afago SP em 2019 - Arquivo Afago SP
Atualmente, além do Mutirão para reforma e construção de novas casas, a Afago SP conta com mais quatro outros projetos, relata Rafael de Miranda Volpe, voluntário e atual presidente da entidade.
Os projetos são o Solidariedade Pedreira (cujo objetivo é aumentar o vínculo da ONG com a comunidade, contribuindo para retirar as pessoas de situação de vulnerabilidade social); Oficinas socioeducativas (sobre os mais variados temas de interesse do público infantojuvenil); Plano de desenvolvimento (que busca ajudar os jovens a planificar seu próprio projeto de vida) e Quadra de Esportes (espaço em construção que deverá acolher projetos na área do esporte e lazer).
Rafael Volpe com uma das crianças - Afago SP
O público atendido diretamente é constituído, hoje, de 280 pessoas, entre crianças e adolescentes, de 6 a 18 anos, da Vila Aparecida, como é atualmente chamado o bairro da Pedreira, e eventualmente de outras quatro comunidades do entorno. “Até hoje, juntos, esses projetos atenderam mais de 3 mil participantes, mas, se considerarmos o público indireto, esse número deveria ser multiplicado por 4 ou 5”, calcula Rafael Volpe.
Para realizar esse trabalho, a Afago SP conta com 30 funcionários, 24 dos quais com contrato fixo. Além disso, a entidade espera contar com a construção de uma sede nova, cuja estrutura deverá dobrar a sua capacidade de atendimento. Volpe espera que, com o tempo, mediante o incremento das doações, a organização adquira mais autonomia financeira e deixe de depender tanto dos recursos públicos.
Num rápido balanço da história desses 40 anos de atividade na comunidade, desde que os primeiros jovens ali chegaram, o presidente da entidade se mostra entusiasmado. Ele considera que o bem que a Afago SP tem feito vai muito além da assistência às crianças e aos adolescentes, os quais os profissionais do projeto esperam livrar das situações de marginalidade.
O impulso positivo dado à vida de muitas pessoas atendidas pela entidade segue contribuindo para o desenvolvimento da comunidade como um todo. “Hoje, conseguimos medir o impacto social de cada ação da Afago SP, que deixou de ser uma obra assistencialista para se tornar um espaço que apoia a comunidade para que essa seja protagonista das próprias conquistas”, avalia Volpe.
Serviço: para conhecer mais sobre a Afago SP e saber como realizar doações para a entidade, basta acessar seu site oficial www.afagosp.org
A Redação
Matéria originalmente publicada na Revista Cidade Nova de Outubro de 2019