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Histórias de superação e mobilização social são premiadas em Brasília

O Prêmio Direitos Humanos foi entregue para 19 pessoas e entidades com atuação de destaque em diversas áreas

por Marcelo Brandão - Agência Brasil   publicado às 08:02 de 15/12/2016, modificado às 08:52 de 15/12/2016

Leonildo Monteiro e Marinaldo Santos vieram de lugares opostos do Brasil, um do Paraná e outro do Maranhão e se encontraram em Brasília por uma característica comum. Ambos passaram por situações degradantes, conseguiram superá-las e hoje lutam para que outras pessoas não sofram dos mesmos males. Leonildo foi morador de rua e Marinaldo vítima do trabalho escravo em fazendas no Norte do país. Obtem (14), receberam o Prêmio Direitos Humanos pela atuação contra tais violações.

O ministro Alexandre Moraes entrega o Prêmio Direitos Humanos 2016 a Leonildo José Monteiro Filho junto da secretária Especial de Direitos Humanos, Flávia Piovesan. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

“Um amigo meu estava trabalhando e fez um serviço que o patrão não gostou. O patrão reclamou e ele disse que não fez o serviço porque estava se sentindo mal. O patrão 'esculhambou' ele, pegou uma vara e deu duas 'lapadas' nele. Eu fiquei muito sentido com aquilo. Naquele dia eu disse que não trabalhava mais numa situação dessa, que não dava para mim”, lembra Marinaldo.

Ele foi resgatado de uma fazenda no Pará. Foi com uma promessa de emprego e, chegando lá, se deparou com um cenário diferente. “Era tudo às nossas custas. Trabalhamos dois meses e nada de sair dinheiro. Comprávamos as coisas caras, não nos davam material, era tudo por nossa conta. Então estávamos trabalhando praticamente de graça. Nem dinheiro para a passagem a gente tinha”, conta o maranhense de 44 anos.

Dois amigos de Marinaldo saíram da fazenda e foram buscar ajuda no município de Açailândia. Esperavam que de lá, em um Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos, viesse a ajuda. O resgate veio e os tirou de um período de muito trabalho e nenhuma contrapartida. Chegaram ao fim os dias de beber água suja de igarapé, passar fome e dormir em barracos de lona.

“Eu fui em muitas reuniões no Centro de Defesa e fui aprendendo, reconhecendo o que é o direito do trabalhador. E existem muitas pessoas que vão trabalhar e não tem experiência. O meu trabalho é alertar, abrir o olho daquelas pessoas que têm necessidade de trabalhar da mesma maneira que eu tive, para não cair na mesma situação que eu passei”.

Marinaldo nunca sofreu ameaças de fazendeiros, mas sabe que o perigo existe. "Eu fico com um pouco de medo, mas não é o medo que vai fazer eu deixar que aconteça com outras pessoas o que aconteceu comigo. Para acabar com isso, a gente precisa se unir e dizer não”.

Fome e frio nas ruas de Curitiba

Aos 19 anos, Leonildo vivia um ambiente conturbado em casa, fruto das desavenças com o pai. “Foi um conflito familiar, meu pai é militar e tínhamos visões diferentes e a gente não dava certo. Acabei indo procurar outros rumos, outra cidade para pensar no meu futuro e acabei indo para as ruas”, conta. Mato-grossense de Nortelândia, deixou a casa da família e foi tentar a vida em Curitiba (PR).

Conheceu a fome e o frio nas ruas da capital paranaense, além da violência de grupos de skinheads. Mas, para ele, isso não foi o pior. “Acho que a pior violência não é a física e sim quando não percebem que você existe. Você vê que uma parte da sociedade trata os seus animais de estimação com mais dignidade do que tratam a gente”.

A vida de Leonildo começou a mudar quando conheceu o Movimento Nacional da População de Rua. Foi convidado a participar ajudando outros como ele a conhecerem os seus direitos previstos no Decreto 7.053 de 2009, que institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua.

“Foi aí que eu vi que tinha direitos, que estavam na Constituição e vi que se a gente se organizasse poderia acessar moradia, trabalho, educação; coisas que eu tenho hoje”. Depois de seis anos vivendo na rua, terminou o ensino fundamental e hoje, além do trabalho com o movimento, também faz parte do Conselho Nacional de Direitos Humanos.

“Temos que organizar, levar para a população de rua que quem precisa defendê-los são eles mesmos. Eles têm que ter o protagonismo, cobrar do Estado, da Defensoria Pública ou do Ministério Público a efetivação de uma política. A gente tem o decreto e essa política precisa ser implementada. Quando isso acontecer, muitas pessoas deixarão de morar na rua”.

Prêmio Direitos Humanos

O Prêmio Direitos Humanos foi entregue para 19 pessoas e entidades com atuação de destaque em diversas esferas dos Direitos Humanos. O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, participou da premiação e parabenizou os agraciados. “Que, nas próximas gerações, cada um já nasça repudiando o preconceito, racismo e tratamentos desiguais. Esse prêmio, mais do que reconhecer o sacrifício pessoal de cada um, tem um imenso simbolismo, de que lutar pelos direitos humanos é lutar pelo bem”.

Tags:

Direitos Humanos, justiça, solidariedade, trabalho escravo, moradores de rua, transformação social, superação, protagonistas

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