Após o reatamento diplomático entre Cuba e Estados Unidos, a normalização das relações entre os dois países ainda tem pendências a serem resolvidas, principalmente a suspensão do embargo econômico, comercial e financeiro imposto à ilha caribenha desde 1962. Especialistas ouvidos pela Agência Brasil avaliam que a sociedade cubana deve perceber mudanças mais significativas em seu cotidiano com o fim do bloqueio econômico.
No dia 20 de julho, as embaixadas foram reabertas em Washington e em Havana após 54 anos de rompimento diplomático. Foto: Ismael Francisco/CubaDebate
No dia 20 de julho, as embaixadas foram reabertas em Washington e em Havana após 54 anos de rompimento diplomático. Nesse dia, após reunião com o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, o chanceler cubano Bruno Rodríguez disse que Havana reconhece a determinação do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em trabalhar para suspender o embargo econômico a Cuba e reiterou a urgência de o Congresso norte-americano eliminar o bloqueio, que restringe as trocas comerciais e o acesso de empresas e investidores à ilha caribenha.
Para o professor do curso de relações internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Paulo Pereira, a reabertura das embaixadas tem importante caráter simbólico de remoção de um dos resquícios da Guerra Fria, mas representa apenas o início de um ciclo que só vai se completar com o fim do embargo. “Quando o embargo for retirado, a gente vai começar a ver, aí sim, uma maior transformação política e econômica e vai poder dizer que esse anacronismo da Guerra Fria foi colocado de lado pelos Estados Unidos”.
Na avaliação do professor, as mudanças que vão ocorrer para o cidadão cubano ainda vão precisar de um tempo para aparecer. “O ponto mais fundamental desse processo é uma gradual abertura de comercialização entre Estados Unidos e Cuba, especialmente a partir do momento, e esse é o grande teste desse reatamento diplomático, do fim do embargo. Enquanto isso não ocorrer, as mudanças ainda vão ser muito tímidas. Acho difícil que o cidadão comum sinta tão presente agora qualquer transformação”.
Pereira acredita que a retomada das relações vai possibilitar uma maior circulação de pessoas, principalmente dos cubanos exilados nos Estados Unidos para visitar a ilha caribenha. “Existe uma série de restrições de viagens entre os dois países e, com o reatamento, isso deve ter um relaxamento. Já havia uma distensão nesse sentido há pelo menos um ano e meio e agora esse processo será intensificado”.
O professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) Argemiro Procópio Filho também acredita que as visitas e as remessas de dinheiro serão facilitadas. “Muitas pessoas em Cuba têm parentes nos Estados Unidos e o envio de ajuda financeira sempre foi difícil. A facilitação das viagens e das remessas já é um grande passo. O processo de mudanças é lento, não é da noite para o dia. Cuba é um mercado em potencial para diversos setores, como, por exemplo, telecomunicações.”
O consultor e ex-secretário de comércio exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Welber Barral, diz que uma das principais apostas da economia cubana para se reerguer é o afluxo de turistas americanos. Segundo ele, o turismo é uma das principais atividades econômicas da ilha caribenha que teve grande investimento em resorts e hotéis de grupos europeus.
Barral lembra que a economia cubana foi subsidiada pela União Soviética na época da Guerra Fria e passou a vivenciar forte crise a partir da década de 1990. “A abertura do mercado americano será muito importante. Cuba vai poder exportar produtos tradicionais, como charutos e rum, o que vai ajudar sua economia”.
O ex-secretário de Comércio Exterior explica que a economia cubana está em transição. “Para atrair capital estrangeiro, Cuba já fez algumas reformas permitindo investimento externo em alguns setores, como turismo. Os cubanos já podem ter alguns pequenos negócios, como restaurantes e táxis. Uma transição para uma economia de mercado vai vir com o tempo, não vai ser de um dia para o outro”.
Barral destaca que o Brasil, ao financiar o Porto de Mariel, em Cuba, saiu na frente nesse novo cenário que se desenha para a região. “Cuba tem uma posição geográfica privilegiada, no centro do Caribe. O Porto de Mariel já vai dar uma estrutura logística muito boa para embarque e desembarque de mercadorias. A médio prazo, Cuba pode crescer na área logística. Para o Brasil, interessa que a economia cubana volte a crescer para consumir produtos manufaturados nacionais.”