O exemplo do governo da Noruega, que no mês passado anunciou retirada de investimentos do fundo soberano em empresas que têm parte significativa de seus ativos na exploração e queima de carvão, deveria ser seguido pelo Brasil, com maiores investimentos em fontes renováveis. A opinião é do secretário executivo do Observatório do Clima, Carlos Rittl. Com a decisão do Parlamento norueguês, o Fundo de Pensão Governamental Mundial (GPFG), considerado o maior fundo soberano do mundo, deverá retirar investimento de 122 empresas, no total de 7,7 bilhões de euros.
Energia eólica. Foto: Albert Vilchez/Creative Commons
“Ele manda uma mensagem clara para o mercado e para os investidores: a tendência é buscar alternativas aos combustíveis fósseis”, disse Rittl ontem (7) à Agência Brasil. Para ele, as políticas brasileiras de expansão da geração de energia deveriam considerar as mudanças climáticas e os riscos dos investimentos na hora de alocar os recursos. Ele destacou que hoje o Brasil projeta colocar 70% dos investimentos em energia em combustíveis fósseis, nos próximos dez anos. Esses recursos vão gerar impactos no clima e podem se transformar em investimentos de alto risco, apontou.
Embora o Plano Decenal para Expansão de Energia, da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), preveja aumento dos investimentos em fontes limpas, esses investimentos ainda são reduzidos, “perto do que se tem de potencial, em especial em algumas fontes”, avaliou Rittl. É o caso, por exemplo, da energia eólica (dos ventos): segundo ele, nos próximos anos o Brasil aproveitará menos de 10% do potencial de geração dessa fonte. Ou da energia solar, em que o Brasil “ainda engatinha, enquanto outros países desenvolvidos e em desenvolvimento estão caminhando muito rápido”.
Nesse sentido, destacou os Estados Unidos, a Alemanha, a China e a Índia, que além de avançar, estão estruturando cadeias produtivas, que geram empregos e produzem uma tecnologia que será solução para os próprios países e para o mundo inteiro. “O Brasil está deixando de lado o aproveitamento de algumas fontes, que poderiam ser mais bem exploradas, e poderia investir muito mais nessas fontes”. Membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza, Carlos Rittl observou que a energia solar é a fonte cujos custos mais caem no mundo. Por isso, sugeriu que o Brasil tenha mais estratégias para investir nessas fontes renováveis.
Ele disse que as mudanças climáticas devem ser incorporadas em todo o planejamento energético, englobando as emissões que os combustíveis fósseis irão gerar. Segundo Rittl, mesmo que exporte parte importante do petróleo do pré-sal, a exploração desse óleo vai gerar emissões dentro do Brasil, o que acaba tornando de risco tais investimentos. “Temos que entender de que forma as mudanças climáticas impactam a nossa segurança energética.”
A situação recente de seca, com nível baixo dos reservatórios das hidrelétricas, acionou termelétricas movidas a combustíveis fósseis, o que ampliou emissões de gases causadores do efeito estufa. O aumento de participação de fontes não fósseis na matriz energética e a substituição de combustíveis fósseis na matriz de transportes são soluções apontadas por Rittl para reduzir as emissões de gases poluentes no Brasil.
As projeções de investimentos em fontes de geração de energia não devem olhar para os anos passados, mas incorporar o cenário climático futuro, que aponta o que vai ocorrer nos próximos 30 ou 40 anos, que é o período de vida útil de uma grande usina, indicou Rittl. “Não estamos fazendo isso”. Daí, o país corre o risco de ver projetos, como o da Usina de Belo Monte, com alta vulnerabilidade à mudança de clima, associada a impactos sociais, ambientais e locais. É preciso olhar para o clima futuro de maneira mais estratégica, afirmou.
Na opinião do coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel) da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Nivalde de Castro, o exemplo norueguês indicado por Rittl não se mostra muito consistente em função das diferenças entre o Brasil e a Noruega. A evolução da matriz elétrica brasileira vai necessitar, “obrigatoriamente”, de usinas termelétricas, para garantir a segurança energética, pois o Brasil não tem mais capacidade de dar segurança por meio dos reservatórios, porque eles não crescem mais em relação à demanda e todas as outras fontes são “interruptíveis”, afirmou.