Espiritualidade
  

Santa Scorese: um farol de fé para os dias hoje

TESTEMUNHO No breve relato a seguir, apresentamos um perfil da jovem italiana cujo processo de canonização está em curso. Ao sofrer o martírio, ela escolheu doar a própria vida por amor a Deus

por Jônia Quédma   publicado às 00:00 de 08/07/2024, modificado às 13:43 de 08/07/2024

ELA era uma jovem que se chamava Santa. Italiana, Santa Scorese nasceu em 6 de fevereiro de 1968 em Bari, na região da Puglia, sul da Itália. Teve uma vida breve, interrompida de forma violenta. E por que sua história merece ser contada? Porque o que a define é como viveu e se tornou referência para jovens da atualidade. No âmbito da Igreja Católica, ela foi declarada serva de Deus, o primeiro passo no caminho para a canonização.

Desde a adolescência, a jovem italiana demonstrou uma forte vocação para a fé católica, envolvendo-se em diversas atividades da igreja local. As preferências dela eram típicas de pessoas da sua geração: ela gostava de música, de leitura, de estudos, dos encontros com os amigos e, sobretudo, era encantada pela possibilidade de amar concretamente quem estivesse por perto.

A vida de Santa mudou quando ela passou a ser assediada por um stalker (perseguidor em inglês), que havia se tornado obcecado por ela. Apesar das repetidas denúncias feitas por Santa e sua família às autoridades, as leis na época não eram adequadas para lidar com casos de perseguição e assédio, deixando-a vulnerável. 

Nas perseguições, o assediador queria obrigá-la a romper com suas crenças, com o que ela jamais concordou. Com medo, Santa se viu obrigada a estar sempre acompanhada por alguém de sua confiança. Ela temia pela própria vida, perdeu a sua liberdade de ir e vir, mas não cedeu. Naqueles momentos de muito sofrimento, escolheu confiar na Virgem Maria e em Jesus Abandonado, colocando-os como centro da própria existência. Nessa escolha, ela não vacilou, mas foi “até o fim, até dar tudo” de si para ser fiel à sua escolha. Quem a inspirou nessa decisão foi Chiara Lubich, fundadora do Movimento dos Focolares, ao propor aos jovens do Brasil, em 1991, essa postura radical como medida de amor ao próximo.

Em 16 de março de 1991, Santa Scorese tinha ido ajudar uma família e depois foi à paróquia encontrar-se com os seus companheiros da Ação Católica. À noite, em um descuido, seu perseguidor a abordou e a esfaqueou várias vezes. Antes de morrer, Santa perdoou o assediador. A morte dela comoveu o país e o mundo. Hoje, é lembrada com destaque tanto pelo seu legado espiritual quanto pelo social. Memoriais e eventos em sua homenagem já se tornaram comuns, e sua história continua a inspirar muitos fiéis e ativistas. 

Amor e coerência

Ainda adolescente, Scorese conheceu o Movimento dos Focolares e passou a atuar com muito empenho a vivência do Evangelho. Maria Regina Maurantonio, que ainda mora em Bari, conviveu com Santa na juventude. Ela conta sobre a simplicidade e a profundidade da amiga:

“Santa Scorese era uma jovem como muitas outras; [...] ela era certamente brilhante e muito intuitiva, em especial na relação com as pessoas, já que era capaz de entender o estado de espírito delas. Descobri como era extraordinária depois de sua morte. De seu diário transparece um relacionamento muito intenso com Deus, o Pai, com Jesus, que ela sentia ser seu irmão e aquele que estava sempre perto dela, porque o havia descoberto em seu abandono na cruz e, portanto, por trás de cada dor ou fracasso”.

Maurantonio conta que elas se conheceram em 1985, depois do Genfest internacional de Roma (festival juvenil do Movimento dos Focolares). Santa tinha dezessete anos e elas participaram da banda que foi criada para reunir jovens e compartilhar o carisma de Chiara Lubich: “Que todos sejam um”. Ela conta:

“Santa começou, com outros jovens do Movimento dos Focolares, a ir com frequência a uma casa de repouso para visitar os idosos solitários e a outras instituições para crianças órfãs nos municípios vizinhos. Esse chamado ao amor a tornou disponível para os outros, solidária com seus amigos, pronta para ajudar aqueles que via em dificuldade, para encorajar e aconselhar aqueles que passavam por momentos difíceis. Assim, Santa tornou-se um ponto de referência para muitos. Depois de alguns anos, começou a perseguição. E mesmo na condição de “perseguida”, ela não desistiu do trabalho voluntário, da assistência, da caridade cristã, bem como de seu compromisso com a universidade. Essa foi Santa: uma jovem de postura decidida que, embora ainda estivesse procurando como responder ao chamado de Deus, foi tão fiel que disse, depois de receber o último bilhete ameaçador: ‘Aconteça o que acontecer comigo, eu escolhi Deus’. Esse nos parece ser o seu testamento”.

De fato, o diário diz muito da profundidade espiritual que, entre lutas interiores, se desenvolveu. Na página dedicada ao dia 17 de novembro de 1987, ela escreveu: “Descobri uma coisa: que Deus é realmente a única certeza inabalável da vida de cada um de nós. Sinto que agora, muito embora dentro de mim haja uma grande agitação, a sua presença doa tranquilidade e confiança. Confiança no fato de que eu não estou sozinha, de que Ele me ama, apesar de tudo, apesar dos meus limites, e sinto também a necessidade de escolhê-lo novamente a cada dia como a coisa mais importante para mim, pela qual vale a pena lutar, sofrer e morrer”.

A reputação de santidade não parou de se espalhar, o que levou à abertura da causa de beatificação de Santa Scorese em 1998. O processo envolve uma investigação detalhada da vida, das virtudes e dos escritos da jovem de Bari e a coleta de testemunhos que evidenciam sua santidade e o impacto espiritual que ela teve na comunidade. Na 2ª Fase do Genfest 2024, em Aparecida, Santa terá um espaço especial, entre outros jovens que foram inspirados e se motivaram a viver pela fraternidade no mundo.

Matéria originalmente publicada pela Revista Cidade Nova, edição de julho 2024.

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